quinta-feira, 30 de maio de 2013

O Seguro das Roupas de Morzin

Coitada da minha mulher. Ela é uma pessoa pura e ingênua. A semana passada eu disse a ela. "-Faça um seguro para as suas roupas. É mais prático e mais barato! Do jeito que vc está fazendo, está jogando dinheiro fora!" Mas ela não me ouve.  Imagina! Quinta feira foi a terceira vez que encontro um sujeito dentro do guarda roupas. E ela não aprende. Cada dia um homem diferente. Pudera! O ambiente é escuro, quente, insalubre. Não adianta contratar seguranças para vigiar as roupas dela, tem mesmo é que fazer um seguro!  No lugar deles eu também me sentiria mal e não ficaria mais que um dia, ou talvez horas. Estou insistindo na tese do seguro, vamos ver se essa cabecinha dura muda de opinião. Mas não está sendo fácil.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Aquela senhora da foice...











A morte talvez seja a única maneira de minimizar essa brutal desigualdade que existe entre poucos privilegiados e o resto da Humanidade. Nada mais democrático do que, de um lado, a pobreza. E de outro, a morte.




sábado, 25 de maio de 2013

Boa Noite, Cinderela!

Estava de castigo no Hospital do Servidor Municipal. Cólicas renais me obrigaram a ficar no soro. E quando eles passam soro, é soro pra paciente nenhum botar defeito. Litros e litros. Certa manhã, entrou no PS uma garota muito bonita, vestida com umas roupas esquisitas e chorando muito. Ela chorava, arqueava o corpo (sentada) e apertava a barriga. E nada de ser atendida. Fiquei com dó e puxei conversa. E ela começou a contar. Queria ir numa balada. Uma amiga convidou para ir na Love Story, ali na República. Foram. Lá, se deixou encantar pela gentileza de um rapaz que ofereceu um gole de bebida para ela. E apagou. Voltou  a si em frente ao Pronto socorro, dia amanhecendo, com uma terrível dor na barriga e sem saber o que aconteceu. Ela chorava, puxava as roupas para mostrar e dizia: "Olha aqui essas roupas horríveis. elas não são minhas. eu só uso roupa de marca e não essa porcaria." e chorava copiosamente, sempre se arcando de dor na barriga. Aí eu disse a ela: Minha filha, você foi vítima do "boa noite cinderela".  Você nunca deve aceitar nem bebida nem comida de estranhos na noite de São Paulo. Eles colocam uma droga que se dá para pessoas que vão operar. Você continua falando, mas fica como se estivesse bêbada e depois, não lembra de nada nem do que fez, nem do que fizeram com você. É preciso muito cuidado com essas coisas. Eles poderiam até ter matado você! Nisso chega a mãe. Vê a filha naquele estado e começa a chorar. Como eu tenho uma filha da mesma idade, senti na alma aquele drama da mãe e chorei junto, mas quieto no meu canto.  Depois fiquei imaginando o perigo de DST, gravidez indesejada e o trauma que fica. E pela dor que ela sentia na barriga, ou a droga que eram a ela detonou o estômago, ou o pior mesmo pode ter acontecido. Em seguida ela foi atendida e não mais a vi. Ficou só aquela angústia que ela me passou de não saber o que tinha acontecido, quem eram as pessoas com quem ela estava e o que fizeram com os pertences e a roupa dela. E pensei com os meus botões: hoje em dia, coisas aparentemente inocentes podem ser extremamente perigosas. E a garota deveria, sim, estar muito feliz por ter sido deixada toda arrebentada por dentro na porta do hospital, mas - viva! 

quinta-feira, 23 de maio de 2013

O Tarado do Carnaval

Vinte e poucos anos, os hormônios efervescendo nas veias, peguei a loirinha e levei para o covil. O covil era um lugar alocado por um amigo, que pertencia à família dele, mas era abandonado e só a gente tinha a chave da porta da frente, em plena cidade. Em lá chegando, fui beijando aquela maravilha de menina. Seus também vinte e poucos anos, magrinha mas gostosa, me levaram à loucura. Quando comecei a entrar para as vias de fato, ela começou a soluçar e dizer:
"-O que que é isso que vc está fazendo comigo?  Eu nunca fiz isso!"
De um lado fiquei mais excitado por saber que ela era virgem, mas de outro, minha consciência começou a me detonar. Vesti a roupa e fui embora. 
Acabara-se o meu carnaval. Onde já se viu, um sujeito como eu, ser canalha a ponto de tirar a virgindade de uma garota só porque era uma baile de carnaval? Para mim, o carnaval acabou. A minha consciência determinara: "vc é um canalha, fique no seu lugar, na sua insignificância, seu tarado!" 
Passado o carnaval, estou sentado no banco da praça da matriz, vendo o movimento. Vejo uma criança dos seus dois anos correndo pelas pedrinhas portuguesas do calçamento da praça; e de repente, ouço uma voz meio conhecida. "-Filhinho, não corre que você cai." Olhei. Era a loirinha virgem que eu evitara de desvirginar dias antes. Eu tinha contado a história para os meus colegas que estavam na praça naquele momento. Foi a salvação. Quando levantei para dar umas porradas nela, me seguraram. Meus amigos riam demais e isso me irritava sobremaneira. E ela foi embora, levando o pequerrucho que hoje, deve ter mais de 40 anos. 

Ação e Reação


Estava sentado na sala, assistindo televisão. Alguém chamou pelo nome do lado de fora da casa. Quando olhou, levou um tiro fatal no meio da cara. Até hoje, um crime não solucionado. Sem testemunhas. Sem provas. Sem nada.

Ele era um cara ousado. De uma pequena empresa, fez um império. E para isso, comprou muito de um só fornecedor. Ficou amigo íntimo do diretor da multinacional que lhe fornecia mercadoria. Iam pescar no Araguaia juntos. Para as praias do nordeste juntos. E ele sempre gentil, sempre amigo, sempre leal, sempre legal. O norteamericano não sabia do perigo. Um dia, uma mega-compra de mercadoria. É arriscado, mas o amigo merecia essa moção de confiança. E concedeu o crédito. Milhões em mercadoria. Não deu outra. Todo o estoque foi vendido e nenhum tostão foi pago. O amigo gringo foi sumariamente demitido e voltou para os EUA. E a rede de lojas se consolidara com esse golpe monstruoso.

Ao comentar essa morte, um amigo conta outra história. "Ah, ele era assim mesmo. Meu velho pai é marceneiro. Ele pediu uma cozinha completa em fórmica. Meu pai fez. Quando entregou, ele disse que não iria pagar o preço combinado. Diante da insistência de meu pai, dizendo que se endividara nas lojas comprando material para fazer a cozinha, ele concordou em pagar a metade e mais nada."

Pensando com os meus botões, logo em seguida, cheguei a uma sombria conclusão. É claro que aquele assassinato era algo lamentável. Mas foi um fim muito procurado pela própria vítima.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Vidas Pilotadas

Um projeto de vida é como uma carta de navegação feita por um piloto de avião. Ele planeja tudo. De onde vai sair, onde vai chegar, pontos de apoio, alternativas, velocidade de cruzeiro, duração da viagem, quantidade de combustível e outros detalhes.  Depois de partir, em pleno vôo, se ele programou ir para NE e defronte se forma uma grande tempestade, ele tem duas opções: ou escolhe um aeroporto alternativo, aterrissa e espera a tempestade passar, ou desvia fazendo um semi-círculo, à esquerda ou direita, para contornar a tempestade. Na vida, as coisas também são assim. O que planejamos para nós, são objetivos passíveis de adequações de percurso. E sonhos adiados são verdadeiras fatalidades: acontecem mesmo. Mudanças de rumos, troca de objetivos, saídas radicais, são também opções válidas nesse vôo gigantesco que é a nossa vida. E nessa pilotagem, há que se ter bom senso, paciência, saber renunciar momentaneamente a coisas programadas que não acontecerão e muita fibra, tenacidade, para não desistir e fazer um pouso forçado em meio a uma plantação qualquer. É preciso chegar ao aeroporto enunciado na nossa carta de vôo. 

sexta-feira, 10 de maio de 2013

A importância do Doutorado



QUANDO SE TEM DOUTORADO

O dissacarídeo de fórmula C12H22O11, obtido através da fervura e da evaporação de H2O do líquido resultante da prensagem do caule da gramínea Saccharus officinarum, (Linneu, 1758) isento de qualquer outro tipo de processamento suplementar que elimine suas impurezas, quando apresentado sob a forma geométrica de sólidos de reduzidas dimensões e restas retilíneas, configurando pirâmides truncadas de base oblonga e pequena altura, uma vez submetido a um toque no órgão do paladar de quem se disponha a um teste organoléptico, impressiona favoravelmente as papilas gustativas, sugerindo impressão sensorial equivalente provocada pelo mesmo dissacarídeo em estado bruto, que ocorre no líquido nutritivo da alta viscosidade, produzindo nos órgãos especiais existentes na Apis mellifera.(Linneu, 1758) No entanto, é possível comprovar experimentalmente que esse dissacarídeo, no estado físico-químico descrito e apresentado sob aquela forma geométrica, apresenta considerável resistência a modificar apreciavelmente suas dimensões quando submetido a tensões mecânicas de compressão ao longo do seu eixo em conseqüência da pequena capacidade de deformação que lhe é peculiar.

QUANDO SE TEM MESTRADO

A sacarose extraída da cana de açúcar, que ainda não tenha passado pelo processo de purificação e refino, apresentando-se sob a forma de pequenos sólidos tronco-piramidais de base retangular, impressiona agradavelmente o paladar, lembrando a sensação provocada pela mesma sacarose produzida pelas abelhas em um peculiar líquido espesso e nutritivo. Entretanto, não altera suas dimensões lineares ou suas proporções quando submetida a uma tensão axial em conseqüência da aplicação de compressões equivalentes e opostas.

QUANDO SE TEM GRADUAÇÃO

O açúcar, quando ainda não submetido à refinação e, apresentando-se em blocos sólidos de pequenas dimensões e forma tronco-piramidal, tem sabor deleitável da secreção alimentar das abelhas; todavia não muda suas proporções quando sujeito à compressão.

QUANDO SE TEM ENSINO MÉDIO

Açúcar não refinado, sob a forma de pequenos blocos, tem o sabor agradável do mel, porém não muda de forma quando pressionado.

QUANDO SE TEM ENSINO FUNDAMENTAL

Açúcar mascavo em tijolinhos tem o sabor adocicado, mas não é macio ou flexível.

QUANDO NÃO SE TEM ESTUDO

Rapadura é doce, mas não é mole não!!!!!

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Contos de Fadas Repaginados


O Ministério Público, através da Promotoria da Infancia e da Juventude, vai ouvir na semana que vem, o sudito que desobedeceu a ordem da madrasta má e poupou a vida da menina Branca de Neve. Os promotores querem saber as circunstancias em que a ordem para matar a garota foi dada e se houve aí um agravante do crime doloso. Segundo um promotor que nâo quis ter seu nome publicado, a madrasta de Branca de Neve pode ser enquadrada em vários artigos do ECA, Estatuto da Crianca e do Adolescente. Ja o servidor que a deixou sozinha na floresta e matou um veado em seu lugar,  deve responder por abandono de menor e também por maus tratos e morte de animal da fauna silvestre, crime inafiançável. Além disso, consta que corre em paralelo uma investigação no DEIC, porque o servo da madrasta má não tinha porte de arma e nem registro da espingarda com a qual cometeu o crime. Os anões estão em tratamento psiquiátrico, porque todos eles ficaram com transtorno bipolar ao terem que ceder Branca de Neve em casamento para o Príncipe.
Branca de Neve, que desde esses eventos já tem numerosa família, cuida de uma ONG de preservação da fauna silvestre e promove grandes festas beneficentes no palácio. E contrariando o lugar-comum dos contos de fadas, o colunismo social comenta em todos os blogs de fofocas, que Branca está traindo o Príncipe com seu personal-trainer.  E para finalizar, a semana que vem também, algumas Ongs GLBT intimarão os descendentes dos Irmãos Grimm, para saber se o veado da história pode ser substituído por outro animal. As Ongs alegam que tudo é válido, "desde que seja em prol da preservação da boa imagem da categoria, dado que esse tipo de conto estimula a violência contra minorias." 

segunda-feira, 25 de março de 2013

Suprimentos de Escritório


Por um breve período, fazendo um bico durante o dia enquanto trabalhava na TV à noite, dentre outras atribuições cuidei da papelaria da empresa. Ao assumir, comecei a fazer 4, até 5 orçamentos de  fornecedores diferentes, para submeter à aprovação do meu diretor.  Um dia, estava em sua sala e tive oportunidade de matar uma enorme curiosidade. Vendo uma brecha na conversa, perguntei. Chefe, o senhor me pede para fazer vários orçamentos para compra de material de escritório, mas nunca aprova os mais em conta, os valores menores. Eu não entendo isso!  E ele, do alto de sua experiência de vida, me explicou então. Disse: "- Os orçamentos mais altos, são de empresas que querem nos explorar. Os mais baixos, de empresas que possivelmente nos fornecerão um produto de baixa qualidade ou simplesmente não conseguirão entregar o que prometeram.   Então, ficamos com as propostas médias, que não são nem altas, nem baixas, mas teremos a certeza de que não estão nos explorando e confiança na qualidade do que compramos e de sua respectiva entrega.  Naquele momento, vi o quanto estava distante da realidade de algo tão simples e banal como o controle de estoque de material para escritório!

domingo, 24 de março de 2013

Dilema

O problema de ter uma arma, é que ninguém compra algo para não usar.

terça-feira, 19 de março de 2013

Um Lugar

Eu quero um lugar onde eu possa afagar um gato meu, sem me preocupar com coisas e pessoas que invadem a nossa vida fazendo exigências. Uns, querem que nos engajemos na luta contra a corrupção. Outros, querem que ajudemos a salvar o animal em extinção. Outros ainda, querem que nos alinhemos contra o sistema financeiro internacional. E todos nos cobram para que saiamos da imobilidade e ajamos como gente grande. Muito nobre, essa posição. Muito procedente essa cobrança. Apenas quero lembrar a todos, que o meu objetivo de vida, é poder afagar um dos meus gatos serenamente, vendo o ocaso, da varanda da minha casa, em algum lugar deste enorme pais. Não me considero uma pessoa que tenha vindo ao mundo para realizar grandes feitos, nem para participar de sagas em prol do bem e da felicidade dos homens. Lembrem-se: quero apenas afagar meu gato em paz. Talvez não se perceba e nem seja de alguma importância aos grandes salvadores do mundo, da pátria e das instituições carcomidas e podres, o fato de eu não ter tido, nos ultimos anos, nenhum gesto para prejudicar seriamente um semelhante meu. Talvez não seja importante a ninguém, que eu tenha procurado ajudar, na medida de minhas condições e posses, a alguém menos favorecido ou a alguém em situação desfavorável, recuperando a sua autoestima e vigor de viver. Talvez isso não importe nem um pouco - e o que queiram é que eu me alinhe aos grandes manifestantes em prol das grandes causas, querendo grandes resultados, procurando saídas espetaculares para a miséria humana. Desculpem. Meu maior objetivo neste momento, é afagar o meu gato, olhando o horizonte e pensando sobre a grande tragédia que é o equívoco recorrente nas relações humanas.

domingo, 3 de março de 2013

visões de mundo

Em algum lugar do céu, vi rolar uma estrela. Ela rolou e sumiu. Foi há 54 anos. Eu estava na sacada do sobrado em que nasci, na esquina da Xavier Ribeiro com Barão de Mota Pais, sentado no colo de dona Mariquinha, minha bisavó. Esqueci quase tudo de minha infância, mas dessa figura da estrela, me recordo sempre. Talvez tenha sido nesse dia, que apareceu a minha permanente curiosidade com relação ao mundo em que vivo e ao Universo que o acolhe. Essa pequena estrela-rolante estartou dentro de mim a necessidade de saber dos fenômenos da superfície, mas também do céu. Que céu era aquele, todo negro e iluminado apenas por aquela miríade de pontinhos cintilantes? Até onde ele ia? Aonde ele nos levava? Cinco décadas depois, tenho a mesmíssima curiosidade ao olhar o céu. As mesmíssimas dúvidas e interrogações. Mas adquiri, entretanto, algumas certezas. A de que não somos nada diante da criação. Que o globo terrestre é apenas um grão de poeira estelar e que há mundos gigantescamente maiores e profundamente diferentes do nosso. Que embora não tenhamos a explicação, há um sentido e uma inteligência coordenando tudo isso e que, diante da eternidade do tempo e do espaço, poderíamos aproveitar melhor as nossas brevíssimas  existências, tornando-as mais dignas e mais justas do que realmente são.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Hélio e suas mortes


Numa de minhas idas para Campinas, passei pelo mercado da Barão de Jaguara para almoçar. Na saída, dei de cara com o seu Romeu. Nos cumprimentamos e perguntei de Dona Paula e de Helinho.
- A Paula tá bem, mas Helinho faleceu há dois anos, disse seu Romeu.  –Que Deus o tenha. Descansou, respondi. Mandei lembrança à Dona Paula e nos despedimos. A furiosa roda da vida queria nos esmagar, precisávamos nos apressar, cada um em seus afazeres. Mas ao dar as costas ao meu velho amigo, não contive um suspiro de tristeza. Então, Helinho morrera... E caminhando pela calçada da Barão de Jaguara, me sobreveio a lembrança da terrível história daquele rapaz.
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Sou filho de um dos mais competentes gerentes de circo da história recente do Brasil. Meu saudoso pai aos 20 anos de idade passou com o circo pela cidade de minha mãe, ela do alto dos seus 16 anos se apaixonou, casaram-se e antes do meu nascimento já estavam separados. Fui criado por minha mãe. Apesar disso, tive um relacionamento cordial com meu pai e o visitava sempre no circo.  E para eu não ficar ocioso nessas visitas ,ele me punha para trabalhar. Portaria, bilheteria, secretaria. Revelei-me um excelente contato com pessoal de rádio e TV e ele sempre que eu ia ao circo ou o circo passava por  perto de casa, me colocava para contatos desse tipo.  
Em 1978, estava eu em Pouso Alegre, MG. Dono do serviço de alto falante da estação rodoviária da cidade, que então tinha 60 mil habitantes, completava meus rendimentos redigindo os radiojornais da emissora AM local. 
Um belo dia, aparece meu pai na cidade. Me convida para almoçar. E diz que está por estrear o circo em Campinas. Mas a cidade é um cemitério de circos, muito perigosa. Se não estrear bem, será muito ruim, explicou ele. E colocou na mesa uma quantidade de dinheiro que representava o meu faturamento de mais de um ano nas minhas atividades em Pouso Alegre. “-Isto aqui é só um sinal” disse ele. Faremos um cachê semanal parecido com ele. Vc vai trabalhar apenas 8 semanas, fazendo divulgação e contato com rádio, jornal e TV, depois pode voltar.  Meu pai era mesmo bom no que fazia. Não foi um pedido, foi uma ordem. Pedi a um amigo para tomar conta do som na rodoviária, contei a história pedindo uma licença para o dono da rádio e parti, feliz da vida, com o novo bico que se iniciava.
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A pensão no Guanabara ficava ao lado do terreno do circo. A viúva dona Paula, chefiava o estabelecimento, auxiliada por seu segundo marido, o seu Romeu. Nos meus primeiros dias na pensão, permanecia lá só o tempo necessário para dormir. Até que um dia, num domingo, tive uma folga. E permaneci na pensão.
Um rapaz dos seus 30 anos, corte de cabelo à militar, de camiseta e bermudas, sentou-se do meu lado na sala da pensão. Víamos TV. Do nada, ele olhou para mim e disse: “-Os homens estão chegando. Eles vem de Marte.”  Muito compenetrado, levantou-se e saiu. Eu não entendi nada, mas segui vendo TV. Dona Paula, que presenciara a cena de longe, se aproximou de mim rindo e disse baixinho: “-Não liga não. Esse é o meu filho Helinho. Ele tem problema. É assim mesmo. Não dê atenção ao que ele fala.”
E percebi, mesmo, no decorrer do tempo, que realmente, o rapaz só fumava, bebia café o dia inteiro e não falava coisa com coisa.
Um dia, movido pela curiosidade, peguntei a dona Paula se o filho dela tinha nascido daquele jeito.  Não, ela respondeu.  Qualquer dia eu te conto a história do meu filho.
E, não demorou muito para esse dia chegar. Estávamos na varanda, num dia sem movimento, quando dona Paula começou então contar a história de Helinho.
Jovem muito inteligente, Helio tinha um cargo relativamente importante na contabilidade da FEPASA, setor da empresa sediado na capital. Acabara de ter uma promoção, galgando um cargo de chefia.  O jovem era uma grande promessa dentro da empresa. E tinha um grande amor. Fazia planos de casar logo.
Devido às circunstâncias e à responsabilidade ampliada pela promoção, Helinho começou a fazer serões cada vez mais prolongados.
Num sábado, avisou a noiva que ficaria até muito tarde adiantando um serviço e portanto, não compareceria para namorar naquela noite. Mas o coração nos trai mesmo e com o rapaz não foi diferente. Por volta de 9 da noite, sentiu uma vontade muito grande de ver a sua amada. Era muito respeitador, portanto apenas queria passar, dar um beijo e ir embora.
A rua da casa da noiva era próxima ao seu trabalho. Uma rua com arvores de um certo porte, que faziam alguma sombra principalmente à noite. Helinho bateu na casa da amada e foi recebido por alguém da família, que disse que ela teria ido ao cinema.  Ele resolveu esperar. Afinal, seria só um beijo rápido e iria embora em seguida, isso não afrontaria a família da moça.  Colocou-se debaixo de uma árvore, protegido da fraca luz de rua  e esperou. Subito, parou um táxi e ele a reconheceu ao lado do motorista. Pensou em correr para abrir a porta, mas eis que a noiva tascou um beijo cinematográfico no taxista. Ele parou, sem acreditar no que via. E o que se seguou, foi por demais chocante. Transaram dentro do carro, ali mesmo, aproveitando a penumbra da noite.  
Dona Paula contou que Helinho não se deixou ver, voltou para a republica em que morava em São Paulo. No domingo, voltou à casa da noiva, devolveu os presentes e encerrou o noivado.
Algum tempo depois, já em Campinas, durante um derbi Ponte-Guarani, Helinho, na geral do estádio, começa a rasgar a roupa e a gritar o nome da sua amada.  Foi o fim do relacionamento do rapaz com a razão. Nunca mais falou coisa com coisa, nunca mais se recuperou.
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Caminhando pela Barão de  Jaguara, melancolicamente concluo, pensando com os meus botões, depois da notícia que me foi dada por seu Romeu. Na verdade, Helinho morrera muitos anos antes, num certa noite numa rua escura de São Paulo...

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Noções de Realidade


Tento escalar a montanha íngreme de minhas fragilidades. Quero atravessar o pântano de meus medos e passar pela floresta de meus receios mais recorrentes. Vislumbrar, com a ajuda da luz bruxuleante de minha vã esperança, um horizonte possível, que se não me venha a dar bonança e alegrias, pelo menos um pouco de paz e tranquilidade, adequadas à minha condição física e idade. Nesta fase da vida, é difícil até sonhar, porque se acorda com o corpo dolorido e a cabeça inchada. Aquela tocha incandescente que carregavas à minha frente, oh destino, iluminando fartamente o meu caminho, por onde ficou nessa viagem insana e fantástica?  E assim, de esquina em esquina, vou tateando as coisas prováveis da existência e selecionando, dentro do possível, o que me faz bem e o que não. Por vezes, o que não fica e tenho que jogar fora o que sim. E isso dói mais que extração de ciso. Arrebenta o peito, é como se um garotinho inocente tivesse que jogar fora sua coleção de botões ou rasgar um a um seus gibis raros e demoradamente colecionados. A Natureza é boa, mas de vez em quando surta, e teima em nos colocar de joelhos, para experimentar a nossa capacidade, a nossa resistência, a nossa adaptabilidade. Nos faz sentir fortes e poderosos, para no momento seguinte, nos humilhar e nos fazer rastejar, muito embora o nosso coração não queira e a nossa mente sofra por demais com isso. A natureza quer nosso sangue, nosso cérebro, nossa capacidade, nossa resistência só para ela, e nos toma, aos poucos, tudo isso. É quando aquele gigante de ferro e aço, aparencia de pedra e resistência do diamante, se desmancha em lágrimas, como um garotinho indefeso, no fim de sua capacidade de suportar a dor física e moral da injustiça e da intolerância que porventura permeiam o caminho. E um certo dia, quando menos esperamos, porque uma característica marcante do destino é realmente o fator surpresa, nos pegamos totalmente processados pelos moedores de carne e mentes da vida e, assim, depois de uma longa jornada em busca do infinito, na calada da noite, na soleira da porta, como se nada neste mundo nos perturbasse ou incomodasse, afagássemos lentamente a cabeça de um gato, este sim, perfeitamente inteirado do que nos acontece e, solidário. 

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Humanamente

Por vezes, fico olhando as pessoas em seus gestos, ações, posturas. É uma aula muda de Humanidade. Ensina essa aula como é bom ser gente. E como é importante ter reações de ser humano, a situações humanas e por vezes até a situações cósmicas. Quem não se emocionou diante de um por do sol prá lá de lindo? Quem não se sente arrepiado ao saber que o mundo é um mero ponto na imensidão do universo? E que as galáxias, brincado de caleidoscópio, mostram um mundo de cores em transformação, quando em um lugar é uma cabeça de cavalo, em outra, o olho de Deus, em outra, alguma figura nova, inédita, para colorir os nossos devaneios cósmicos, quando a existência conspira contra o bom senso e as posturas politicamente corretas e nos recomenda a loucura, a insensatez, a inobservância do que é aparente correto e supostamente perfeito? Transigir, transgredir, romper com o estabelecido, ou fazer a lição de casa, obedientemente, como qualquer pequeno estudante de nivel médio? Alfa, ômega, qual o sentido de ser assim. Ou de não ser? Qual a medida com que devo te amar. Ou te odiar. Ou te desprezar. Em quanto se mede a minha capacidade de depender de você?

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Palavras

É muito difícil transformar emoções em palavras. Sentimentos em frases. A existência em idéias. Nem sempre temos sucesso ao descrever certas coisas. Nem sempre conseguimos falar ou escrever sobre isso como realmente o é. Porque os sentimentos são ondas que conseguem ter massa e ao mesmo tempo, matéria, que se comporta como onda. Porque a explicação é complicada, muito embora o seu objeto seja de uma tocante simplicidade. Há frases ditas com o olhar que não tem correspondentes na fala ou na escrita. Vemos mudas cenas na arte: Pietá, Pensador, Gioconda... cada um contando uma história sem uma só palavra dita ou escrita. Verbalizar ou passar isso para o papel é uma missão inglória com empedernidos obstáculos. Um exército de oradores, escribas, pensadores, léxicos, gramáticos, professores, autodidatas luta bravamente para transmutar o mágico no verbo. Poucos conseguem,  mas quando o fazem, marcam a história e enlevam milhões de pessoas com suas vidas e obras.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

òdio

Toda vez em que vc for odiar alguém, tenha em mente que a raiva contra outra pessoa, esse sentimento impuro, far-lhe-á mais mal do que ao outro. É como se pegássemos brasas com as mãos, para atirá-las em alguém, com a intenção de ferir.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Nobilitatis

Os animais que se dizem racionais não acreditam que os outros animais, que eles dizem que são irracionais, tem sentimentos nobres e, por vezes, mais nobres do que os deles.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Ser


As minhas palavras, desde ha muito foram totalmente ocultadas por minha atitudes. Por vezes, quando tento dizer que não me agrado, todos os meus sinais são de que é mentira. Quando digo que vou, meu corpo é estático e fica. Quando digo que não me importo nem um pouco, me pego chorando pelos cantos pelo motivo do meu aparente desdém. Meus lábios declaram guerra, mas meu coração é uma trégua só. O contrassenso é meu karma, minha desdita. Santa dualidade, onde o não é sim, o sim é não e os dois são um incomensurável talvez. Ao invés de me perder em meio a tudo isso, penso ter segurado firme na ponta do fio da meada. Mas que nada! Ele se solta de minha mão e se esvai pela escuridão. E fica aquela impressão de que me encontrei nesse vazio das certezas, nesse nada das compreensões. Porque eu sou você. Você, sou eu. E nós, somos o ser.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Coisas da Vida! (Contos de Fadas Repaginados)

O Ministério Público, através da Promotoria da Infancia e da Juventude, vai ouvir na semana que vem, os pais de Chapeuzinho Vermelho. Os promotores querem saber as circunstancias em que a ordem para a menina entrar sozinha pela floresta foi dada e se houve um consenso dos pais. Segundo um promotor que nâo quis ter seu nome publicado, a família de Chapeuzinho pode ser enquadrada em vários artigos do ECA, Estatuto da Crianca e do Adolescente. Ja o lenhador que assassinou o Lobo Mau, deve responder por maus tratos e morte de animal da fauna silvestre, crime inafiançável. Além disso, consta que corre em paralelo uma investigação no DEIC, porque o lenhador não tinha porte de arma e nem registro da espingarda com a qual cometeu o crime. E a vovozinha esta em tratamento psiquiátrico, porque já viúva, ficou com a síndrome de estocolmo e se sente uma completa viúva pela segunda vez.
Chapeuzinho, que desde esses eventos já cresceu e completou a maioridade, estuda uma proposta da Playboy para posar nua e um convite da REDE TV para apresentar um programa de variedades. Mas o colunismo social comenta em todos os blogs de fofocas, é que Chapeuzinho vai mesmo é participar do próximo BBB.